segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

MARLENE OTTO KUMMER

 


MARLENE OTTO KUMMER, PERNAMBUCA, FOI A SEGUNDA VEREADORA DE MOSSORÓ, ELEITA EM 15 DE NOVEMBRO DE 1966.
Natural de Recife, Estado de Pernambuco, nascida no dia 14 de abril de 1936, sendo filha do casal FRANCISCO FREDERICO OTTO KUMMEL e de  LAURA FERREIRA KUMMEL. Foi a primeira advogada a ocupar o Tribunal do Júri de Mossoró. Educadora, foi professora da Escola Estadual Jerônimo Rosado, na cidade de Mossoró-RN, na disciplina de Inglês, nomeada no dia 14 de maio de 1968. Foi uma das diretoras do Instituto Montessori

POR MARICELIO ALMEIDA MARICELIO_ALMEIDA@HOTMAIL.COM

Política, professora, advogada. Marlene Otto Kummer se destacou em todas essas áreas ao longo de sua carreira. Vereadora por Mossoró em 1967, diretora da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Uern, primeira advogada a ocupar o Tribunal do Júri em Mossoró, a entrevistada da semana do caderno Universo enfrenta hoje um dos seus maiores desafios: o mal de Parkinson, doença que há 12 anos a impede de exercer as funções que abraçou com tanta competência.

 

Na conversa a seguir, Marlene Otto relembra episódios marcantes de sua vida, como a eleição de 1968, quando abandonou o grupo político do líder Vingt Rosado e decidiu apoiar o adversário Aluísio Alves, a instalação do Instituto Montessori em Mossoró e o convívio com a Ditadura Militar, destacando ainda as dificuldades enfrentadas a partir do diagnóstico do mal de Parkinson. Acompanhe

 

O Mossoroense: Natural de Pernambuco, como a senhora chegou a Mossoró?

Marlene Otto:Tornei-me filha de Mossoró por conta da outorga do título de Cidadã Mossoroense concedido pela Câmara Municipal nos anos 1970. Vim para Mossoró para me integrar ao Movimento Pé no Chão, tentando implantá-lo na cidade, o que acabou não ocorrendo. Na época passei a lecionar no Colégio das Freiras

OM: Então, a senhora chegou a ser freira?

MO: Sim, foi uma passagem muito rápida, que não me acrescentou em nada. As alunas até me consideravam uma boa professora. Foi um ano e meio aproximadamente. Meu objetivo era trabalhar com o método de Paulo Freire, naquela época todo mundo era meio revolucionário, e eu me via muita envolvida em tudo aquilo.

OM: A senhora tem uma forte ligação com o âmbito da política, tendo sido eleita a única mulher vereadora por Mossoró no ano de 1967. Conte-nos um pouco dessa sua passagem pelo Poder Legislativo

MO: Fui eleita no auge da Ditadura Militar, 1967, pelo voto popular, prestigiada pelo líder Vingt Rosado, eu fui vereadora dele. A minha atuação na Câmara foi marcante porque foi intensa, onde defendi a ideologia do meu partido político, que tenho até vergonha de dizer qual era, a Arena. Não estava envolvida com militares, mas sim com meu líder Vingt Rosado, fazia parte da Arena Vermelha. Dois anos depois de ter sido eleita eu renunciei

OM: Por quê?

va com o quadro político que se desenhava para eleição do ano seguinte. Eu preferi renunciar e passar para o lado de Aluísio Alves. Quando renunciei, Aluísio estava louco para pegar uma novidade, como eu era vereadora de Vingt, fui a grande novidade de Aluísio. Naquela altura, Mossoró era uma panela de pressão, no “Touro” e no “Capim”. Nesse impasse político muito acirrado saiu eleito o “Capim”, ocupando a cadeira de prefeito Antônio Rodrigues de Carvalho, e eu fui nomeada chefe de gabinete da Prefeitura. Já havia sido chefe de gabinete do prefeito Raimundo Soares, mas como ele era do lado de Vingt, quando aderi ao grupo de Aluísio pedi demissão da chefia

OM: E que ações a senhora destacaria do período em que esteve à frente da chefia de gabinete da Prefeitura Municipal de Mossoró na gestão de Antônio Rodrigues de Carvalho?

MO: Ninguém fazia nada. Estávamos muito alegres por ter derrotado Vingt Rosado. Passamos um ano respirando

“Nunca tinha ouvido falar nesse mal, até o dia que o médico Paiva Lopes me diagnosticou, há 12 anos. Passei a não aceitar aquela condição”

do política, política e política. Porém, essa vitória de Aluísio Alves custou a ele a cassação de seu mandato e dos direitos políticos por 10 anos pelo AI-5. Aluísio foi cassado, a pedido de Dinarte Mariz, por conta dessa vitória em Mossoró. Nunca houve uma campanha tão forte como essa. Foi uma campanha muito acirrada, mas no âmbito da política, não de maneira indecente como ocorreu no ano passado, com a prefeita já sendo cassada por seis vezes. Na época, o candidato a prefeito pelo grupo de Vingt foi o seu irmão, Vingt-un Rosado. Quando Aluísio foi cassado fiquei muito desencantada e resolvi deixar Mossoró, indo para o Rio de Janeiro, onde morei sete anos. Lá chegando, passei a trabalhar no Programa Nacional de Teleducação (Prontel), com uma equipe de técnicos em educação formada quase que em sua totalidade por militares, homens muito bem preparados. Comecei então a tirar a política da minha cabeça, respirando uma nova cultura, voltando meus olhos para a educação. Lá no Rio de Janeiro me envolvi com a Metodologia Montessoriana. O Instituto Montessori de Mossoró foi meu. Descobri que em Mossoró estavam aplicando a metodologia, me apressei para voltar e comprei 40% de uma escola, onde assumi a parte administrativa. Foi um momento muito bom para mim.

OM: A senhora então esteve no Rio de Janeiro no auge da Ditadura Militar. Que lembranças guarda dessa época?

MO: O RJ lavou minha cabeça. Apesar de haver muitas mortes, muita polícia na rua, havia uma efervescência educacional. Eu gostei da Ditadura. As pessoas não andavam no meio da rua quebrando tudo como hoje. Havia muito respeito. Claro que havia muita coisa errada, mas ninguém fazia o que se faz hoje não.

OM: Na opinião da senhora, o Brasil vive atualmente um período pior do que o da Ditadura Militar?

MO: Na democracia de hoje se pode fazer tudo, desde que se obedeça a Constituição Brasileira. O que acontece é que estão invadindo propriedades, desrespeitando o próximo. No auge da revolução, você sabia que ganhava R$ 5 mil por mês, e que no mês seguinte ganharia a mesma coisa, e dava para se comprar o que era necessário, não havia greves, por exemplo, era linha dura mesmo. Em partes, gostei da Ditadura. Na época tudo favorecia

OM: E a relação da senhora com o Direito, quando teve início?

MO:Quando comprei 40% do Instituto Montessori, ao mesmo tempoprestei vestibular para Direito. Quando terminei o curso fui convidada pelo reitor, padre Sátiro Cavalcanti, para assumir a função de professora na Uern. Pouco tempo depois, fui eleita diretora do Instituto de Ciências Humanas (ICH). Foi uma eleição muito acirrada, e me elegi com votos dos três segmentos da Universidade. O Instituto agregava quatro cursos: Direito, Ciências Sociais, História e Geografia. Era uma responsabilidade muito grande. Assinava os diplomas dos alunos de todas essas graduações. Depois houve uma divisão do ICH, com Direito de um lado e a Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais (Fafic) do outro, então tive que escolher entre ficar com Direito ou a Fafic.

OM: E qual foi a sua escolha?

MO: Preferi ficar com a Fafic, indicando Paulo Linhares para ficar na diretoria do curso de Direito. Eu até disse em uma reunião que a indicação foi feita pelo cacife que Paulo tinha junto ao prefeito, pois o curso estava precisando muito de uma mãozinha. Ao término do meu mandato na Fafic eu recebi da Reitoria o título de professora emérita da Uern, que guardo com muito carinho. Do Departamento de Direito, na mesma época, fui agraciada com uma menção honrosa pelo bom desempenho à frente do IHC, uma iniciativa do professor Paulo Roberto Dantas Leão

OM: Uma forma de reconhecimento pelo trabalho que a senhora desenvolveu junto à Uern...

MO:Foi. Eu digo que a Uern foi tudo na minha vida. Agora mesmo diante de tantos títulos e honrarias, percebi que minha saúde não ia bem. Na época já era uma advogada criminalista, muito feliz no Tribunal do Júri, eu sentia que a minha saúde não estava muito boa. Vinha de um desgaste da Universidade muito grande. Fui feliz

OM: A senhora citou a participação em Tribunais do Júri, sendo a primeira mulher a atuar, como advogada, em um Tribunal de Júri

MO: A primeira mulher a ocupar a Tribuna do Júri. Eu não sei como está hoje, mas antes se precisava de muita coragem, antes e depois. Antes para preparar a defesa e depois para enfrentar aqueles que perderam as causas

OM: Como se deu o processo de preparação até chegar a ocupação da Tribuna?

MO: Eu já vinha de uma oratória conhecida na Tribuna da Câmara Municipal. Fui locutora da Rádio Tapuyo, tinha facilidade de expressão, uma dicção muito boa. Na Tribuna do Júri o que mais chamava atenção era a minha dicção, minha velocidade de raciocínio, que não tenho mais, que agradava demais aos jurados. Devo ter participado de uns 50 tribunais, perdi só duas causas. Passei uns três anos nessa área, mas adoeci. Sempre fui considerada muito corajosa, firme em minhas decisões. Estudava muito para enfrentar os adversários, que na maioria das vezes eram promotores bem preparados.

OM: Qual foi o caso mais difícil que a senhora enfrentou?

MO:Teve um, cujo advogado era Ítalo Pinheiro. Foi muito difícil mesmo, mas no dia ele estava muito cansado, vinha de uma eleição em Natal, e eu o peguei pelo cansaço, vi que ele estava cochilando. Ítalo não reparou em uma pergunta que tinha no laudo cadavérico, que questionava o autor dos tiros, e tinha ‘ignorado’. Se o autor dos tiros era ignorado, na dúvida absolvese o réu. Era um caso de povo rico do sertão, e o processo ficou guardado muito tempo, as folhas estavam amareladas. Eram cinco réus, aí eu acordei Ítalo e disse ‘Preste atenção: qual desses aqui atirou e matou, Uni Duni Tê’. Isso foi porque ele deu um cochilo, não examinou o laudo, todos foram absolvidos. Ninguém pode condenar ninguém na dúvida

OM: Hoje a senhora mora em Natal. O que a levou a morar na capital do RN?

MO: Estou há três anos morando aqui, com uma esperança que a ciência consiga alguma coisa, não para mim que já tenho 77 anos, mas para aqueles que no futuro possam ser acometidos pelo mal de Parkinson, que é a minha doença. Nunca tinha ouvido falar nesse mal, até o dia que o médico Paiva Lopes me diagnosticou, há 12 anos. Passei a não aceitar aquela condição. Não sei como não morri. Hoje me trato em Natal e em Belo Horizonte, buscando um tratamento que me faça tremer menos, ter menos dores. Soube que em Mossoró existe um grupo que está organizando uma Sociedade de Amigos dos Parkinsonianos, mas como não posso viajar não consegui me inscrever nessa Associação

OM: Mas, a senhora participa de algum grupo nesse sentido?

MO: Sim. Sou inscrita no Instituto de Parkinsonianos do Brasil, localizado no Rio de Janeiro. Eles nos dão uma ajuda psicológica. Muitas pessoas se desesperam ao serem diagnosticadas, principalmente aquelas que tinham uma vida ativa, como a minha. Foi uma mudança muito repentina. As armas do advogado são a escrita e a fala, fiquei sem as minhas armas. Fiquei depressiva, de maneira a não querer receber ninguém em minha casa em Mossoró, não queria que ninguém me visse tremendo

OM: Para concluir, do que a senhora sente mais falta: da Universidade, da Política ou do Tribunal do Júri?

MO: Tudo na minha vida foi muito rápido e intenso, só o que está demorando é esse Parkinson, que não tem jeito. Sinto falta do Tribunal do Júri. Estudava muito, me preparava demais, tanto intelectualmente como psicologicamente, era minha vida. Eu aguardo um milagre da ciência, para tirar muita gente dessa doença. Vamos ver se eles conseguem. No Instituto, dizem que essa é uma doença de intelectuais, pessoas que exploram muito os seus neurônios, o que causa um cansaço.

FONTE – O MOSSOROENSE

PRIMEIRA VEREADORA DE MOSSORÓ

TERCEIRA VEREADORA DE MOSSORÓ

QUINTA VEREADORA DE MOSSORÓ

MARLENE OTTO KUMMER

  MARLENE OTTO KUMMER, PERNAMBUCA, FOI A SEGUNDA VEREADORA DE MOSSORÓ, ELEITA EM 15 DE NOVEMBRO DE 1966. Natural de Recife, Estado de Pernam...